A Revisão Diária - Não exatamente uma novidade

A terceira dimensão da prática do Pathwork, conforme o modelo de trabalho pessoal integrado que apresentamos (link aqui), é a revisão diária. Essa é uma ferramenta poderosíssima no trabalho de autoconhecimento e autotransformação que, como veremos, tem uma longa história e não representa uma novidade trazida pelo Guia. O Guia recomendou o seu uso pelo valor amplamente reconhecido da prática e orientou um enfoque específico para a sua realização, que trataremos em detalhe nesta série de artigos.

Antes, porém, convém resgatar um pouco do passado, destacando as características mais comuns e os benefícios do hábito de manter um diário. A revisão diária, como a conhecemos no Pathwork, é uma prática semelhante à escrita de um diário, mas com um enfoque específico, como mencionamos anteriormente.

 Há mais de 5000 anos, surgiram os primeiros sistemas de escrita e, seja por meio de hieroglifos ou escrita cuneiforme, esses primeiros escritores, entre tantas coisas da vida prática, registraram também reflexões e experiências pessoais.

 Arqueólogos e papirologistas há muito têm encontrado exemplos desses registros muito antigos, milenares, que 
têm às vezes a simplicidade de uma lista de compra, ou a formalidade de documentos como um contrato de compra e venda de um bem. Não faltam, porém, exemplos de registros escritos de experiências pessoais, comumente de coisas muito simples da vida.

O tempo passa e a consciência evolui. Filósofos gregos da antiguidade clássica tinham o hábito de anotar as suas reflexões. Buscavam, com isso, aguçar o raciocínio e ganhar novos pontos de vista sobre os temas analisados.

Marco Aurélio, imperador romano entre 161 e 180, escreveu o livro “Meditações”, que constitui uma série de reflexões muito pessoais sobre a sua vida, redigidas durante campanhas militares. Em uma conhecida livraria online, a sinopse deste livro diz o seguinte: “Marco Aurélio trava um diálogo interior em busca de verdades fundamentais por meio da razão, sem deixar de lado a sensibilidade”. Muitos consideram Marco Aurélio como uma representação do ideal de Platão do que seria um Rei Filósofo, um governante que reina com sabedoria e virtude.

Nos mosteiros da Idade Média, monges foram incentivados a cultivar a prática de escrever um diário. O objetivo era que, por meio do registro frequente de suas experiências religiosas, pensamentos e orações, eles pudessem identificar pontos de melhoria em si mesmos, manter-se firmes no exercício da fé e aprofundar o relacionamento com Deus.

Leonardo Da Vinci, nascido na atual Itália em 1452 e mestre do Renascimento, deixou vários cadernos manuscritos. Cientista, matemático, inventor, anatomista, escultor, arquiteto, botânico, poeta, músico… Nestes cadernos, ele fazia anotações, diagramas, desenhos sobre sua arte e ciência, mas também reflexões pessoais, que hoje são estudadas com o intuito de entender suas motivações internas e processo criativo.

No século passado, Anne Frank, uma menina judia nascida na Alemanha, em 1929, deixou-nos um legado inestimável por meio de seu diário. Em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha ocupou a Holanda, onde a família de Anne Frank morava. Durante cerca de dois anos, ela, sua irmã e seus pais viveram escondidos em Amsterdã. Neste período, Anne, que tinha entre 13 e 14 anos, escreveu diários – na maioria das vezes, cadernos escolares –, em que relatou a rotina do cativeiro e suas reflexões pessoais sobre aquela vivência traumática. Em agosto de 1944, sua família foi descoberta e deportada para o campo de concentração Bergen-Belsen (Polônia), onde foi assassinada, calcula-se, em março de 1945, quando tinha 15 anos.

Os diários de Anne Frank foram encontrados por amigos da família no esconderijo onde moravam, após a descoberta e deportação de todos eles – e antes que o local fosse posteriormente investigado e saqueado pela Gestapo. A publicação das memórias de Anne Frank tornou-se um best-seller mundial. Além do registro histórico, revelou uma menina com uma consciência muito madura. Seu diário é uma reflexão poderosa sobre a condição humana, a luta pela sobrevivência e a esperança persistente em tempos de adversidade.

"Quando escrevo, posso me livrar de todos os meus problemas. Minha dor desaparece, meu ânimo renova-se. Mas, e isto é o mais importante, eu deixo de ter ilusões e meus sonhos se tornam realidade." (O Diário de Anne Frank)

Diário de Anne Frank, exposto no museu de Berlim. 



Para muito além de diários que ficaram famosos por serem escritos por personalidades que marcaram a história  como os de Marco Aurélio, Leonardo Da Vinci ou Anne Frank , sempre houve, a cada geração, um número imensamente maior de pessoas comuns, anônimas, que intuitivamente viram valor em pôr no papel o conteúdo de suas realidades internas: seus dilemas pessoais, suas frustrações, os contornos e conteúdos de seus sentimentos e pensamentos. Eles confirmaram na prática como este hábito ajuda a elaborar questões e amplia a autoconsciência. 

Manter a escrita de um diário por muitos anos é costume de pessoas que cultivam as faculdades do espírito, que buscam a reflexão para encontrar janelas para outras perspectivas sobre a realidade em que estão inseridas. Pesquisas confirmam que se trata de um hábito mais frequente em países de melhor nível socioeconômico e é mais prevalente entre as mulheres do que entre os homens. 

Não há estatísticas conhecidas sobre o hábito de escrever um diário entre os brasileiros. Nos países desenvolvidos e de língua inglesa, todavia, existem alguns estudos realizados por institutos como Ipsos ou Australian Psycological Society, que estimam que entre 15% e 22% da população adulta desses países tem o costume de manter um diário. Sem dúvida, trata-se de uma parcela significativa de praticantes. 

Já mencionamos que as práticas da revisão diária e do diário (journaling) são parecidas, de maneira geral, no método e nos benefícios que produzem. Há, porém, uma distinção marcante, que faz toda a diferença para o método Pathwork. 

Nesta série de artigos que se inicia agora, vamos mergulhar em detalhes nesta dimensão fascinante e fundamental deste nosso caminho de autoconhecimento. 

Muita paz!



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